Somos gays, somos casados e somos pastores evangélicos

Todo tipo de amor combina com Jesus... Por isso, abrimos nossa própria igreja para abençoar as uniões homossexuais.


Sou cristão e gay. Jesus e a Bíblia são meus modelos de comportamento. Acredito no casamento e meu sonho de construir uma família se tornou realidade. Me casei em 2009 com o amor da minha vida. Ele também é um homem de Deus e é pastor como eu. Juntos, fundamos a Igreja Cristã Contemporânea, uma igreja que aceita relacionamentos homossexuais.

Estou certo de que a Bíblia não condena os gays. Sou o primeiro pastor brasileiro a ter uma cerimônia religiosa de casamento com outro homem. Dos 30 pares de padrinhos que convidamos, 29 eram homossexuais. Todas as 11 crianças que entraram na nossa frente foram criadas por dois pais ou duas mães. Quando entramos, tocou uma música evangélica que diz: "Nenhuma condenação há para aquele que está em Jesus".

Nossa lua de mel foi na Costa do Sauípe. Quando cheguei naquele paraíso, passou um filme na minha cabeça. Como foi longo e difícil o caminho que precisei percorrer até me tornar pastor e casar com o Fábio...

Virei evangélico aos 14 anos


Ainda estava na puberdade quando me encontrei com Jesus. Aos 14 anos passei a ir à igreja seis dias por semana. Virava madrugadas estudando a Bíblia, adorava pregar sermões, e aos 17 anos tive certeza da minha vocação para ser pastor.

Aos 19 encontrei uma garota com quem namorei por quatro anos. Cheguei a ficar noivo. Meu futuro parecia traçado, não fosse por um segredo: me sentia atraído por outros rapazes. Eu sabia que isso inviabilizaria meu sonho de ser pastor e que eu jamais poderia casar com um homem. A igreja não admitia isso.

Resolvi me assumir numa boate gay e rompi meu noivado


Era 1999, eu tinha 23 anos e fui visitar um amigo nos Estados Unidos. Certo dia, ele me levou até uma boate gay. Fiquei assustado quando vi tantos homens se beijando! Comecei a fazer as minhas orações: "Deus, por que o Senhor me trouxe neste lugar?". Depois de muito orar, uma voz falou no meu coração: "Sua homossexualidade é pra sempre, você nasceu assim".

Cheguei ao Brasil e rompi meu noivado. A notícia sobre minha orientação sexual se espalhou rápido e não tive coragem de voltar ao templo.

A maioria das igrejas evangélicas só aceita gays que queiram mudar a própria orientação. Mas eu não queria mudar a minha. Nem acredito nessa possibilidade!. Estava decidido a viver a minha homossexualidade. Foi nessa época que, pela primeira vez, me envolvi sexualmente com rapazes. Os anos seguintes foram difíceis. Eu morria de saudade da igreja e tinha vontade de voltar a pregar. Ser pastor estava no meu sangue.

Comecei a pesquisar igrejas gays


Procurei informações sobre igrejas gays norte-americanas e criei um site propondo uma outra maneira de ler a Bíblia. Por exemplo: quase nenhuma igreja aceita o casamento entre pessoas do mesmo sexo, alegando que a Bíblia fala que os efeminados não vão ao céu. mas o termo "efeminado" está mal traduzido - o que o original diz é "mole".

Por essas e outras que os relacionamentos entre homossexuais continuam não sendo admitidos nas igrejas. Criei uma alternativa a elas: em meados de 2002 abri um grupo evangélico para acolher as pessoas que procuram um espaço pra manifestar sua religiosidade cristã ao mesmo tempo em que vivem sua homossexualidade com tranquilidade.

Conheci o Fábio no grupo


Por volta de 2005 o Fábio começou a frequentar o grupo. Passamos a nos paquerar e a sonhar com uma igreja pra acolher homossexuais. Afinal, nosso jeito de expressar afeto tem tudo a ver com a nossa sexualidade.

Deu certo. Em setembro de 2006 assumimos o nosso relacionamento e fundamos a Igreja Cristã Contemporânea. Em dez anos, já juntamos mais de 3 mil pessoas em dez templos - são seis no Rio, dois em São Paulo e dois em Minas Gerais.

Na nossa congregação, defendemos o início da vida sexual durante o namoro, mesmo. Ao contrário das outras igrejas, pregamos que namorados podem ter vida sexual, desde que estejam comprometidos.

Do namoro até o noivado foi um ano. Coroamos nossa história de amor no altar, em 2009. Naquela época, os casamentos entre homossexuais não eram reconhecidos no Brasil. No entanto, fomos até um cartório e fizemos uma escritura declaratória de união homoafetiva. Oficialmente, ela não tem o mesmo valor que um contrato de casamento.

Em 2011, o Brasil passou a reconhecer a união estável homoafetiva, então fizemos uma. Não podíamos usar o mesmo sobrenome nem mudar o estado civil, mas já era algo. Em 2013, o país evolui mais e pudemos finalmente nos casar legalmente. O Fabio passou oficialmente para a família Canuto!

Nessa época, já tínhamos adotado dois filhos, o Davison, de 14 anos e o Felipe, de 12 anos. Hoje eles têm nosso sobrenome e uma certidão de nascimento com dois pais! Há seis meses adotamos a Hadassa Gladstone Canuto, que hoje tem 10 meses e dois pais. Ficamos quatro longos anos no processo de adoção.

Mas sou feliz em dizer que não tivemos obstáculos específicos por sermos gays. Só enfrentamos as burocracias comuns para adotar uma criança. Por isso, montamos um grupo de apoio à adoção dentro da igreja, onde ajudamos casais a entender o processo inteiro e reforçamos a responsabilidade de acolher uma vida!

Somos legalmente casados e temos três lindos filhos

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